« Thomas Merton »
por Marcelo Timotheo da Costa
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If, in the past, I have desired to stop writing, I can see that it is much better for me to go on trying to learn to write under the strange conditions imposed by Cistercian life. I can become a saint by writing well, for the Glory of God, denying myself, judging myself, and mortifying my haste to get into print. Writing is a moral matter, and my typewriter is an essential factor in my asceticism (The Sign of Jonas, 1953, p. 40).
Thomas Merton nasceu em 1915, no Sul da França, filho de artistas, o neozelandês Owen Merton e a norte-americana Ruth Calvert Jenkins. Em 1916, o prolongamento da Grande Guerra motivou a ida da família para os EUA. Em 1931, a morte do pai – Ruth falecera dez anos antes – levou o adolescente Thomas àt utela do padrinho, Thomas Izod Bennett, cirurgião prestigiado em Londres. Em 1933, Thomas Merton ingressou na Universidade de Cambridge. Dali seria expulso, provavelmente por haver engravidado moça solteira.
Voltou aos Estados Unidos, retomando os estudos em Columbia. Nesse tempo de formação, escreveu para a Columbia Review e a revista humorística Jester, entregando-se também a atividades boêmias. À mesma época, interessou-se por questões políticas, tendo passagem fugaz pela Young Communist League. Participou de manifestações pacifistas, protestou contra a invasão da Abissínia (atual Etiópia) pelas tropas de Mussolini e aderiu ao Oxford Pledge, recusando-se a lutar em qualquer guerra.
Em Columbia, período de intenso turbilhonamento interior, Merton despertou para assuntos religiosos – na infância, passara por denominações protestantes, não criando vínculos. Após manifestar curiosidade por religiões orientais, voltou-se aos clássicos da espiritualidade cristã. Em 1938, converteu-se ao catolicismo romano. Meses antes, graduara-se em Humanidades. No ano seguinte, na mesma universidade, obteve o mestrado em Inglês, com dissertação sobre o poeta e pintor inglês William Blake (1757-1827).
Retira-se, logo depois, para Olean, Nova York, indo lecionar Literatura Inglesa na St. Bonaventure University. Neste período, de 1940 a 1941, Merton dedica-se a práticas contemplativas e empenha-se nos Exercícios Espirituais inacianos. Decidiu tornar-se sacerdote, sendo recusado pelos frades franciscanos – provavelmente, sua vida pregressa criou obstáculos à admissão na Ordem. No final de 1941, radicalizando a escolha religiosa, optou pela vida monástica, sendo aceito entre os trapistas da Abadia do Gethsemani, Kentucky. Ali, recebeu a ordenação presbiteral em 1949.
No claustro, Merton foi autorizado a escrever. Sua precoce autobiografia, A Montanha dos Sete Patamares (1948), alcançou notável sucesso de crítica e público. No ano seguinte, a tiragem do livro superava 600 mil exemplares. Daí adveio trajetória literária profícua que, entre publicações em vida e póstumas, totalizou mais de 70 livros, em prosa e poesia, em umerosos textos especializados. Conte-se, em acréscimo, impressionante volume de cartas e os diários, contendo apontamentos de 1939 até os últimos dias de Merton. Epistolário e diários publicados décadas após o desaparecimento do autor, totalizando, respectivamente, cinco e sete volumes.
A vultosa bibliografia revela: mais que apenas monge, Merton foi um monge-escritor. Condição expressa na proposição acima citada: “my typewriter is an essential factor in my asceticism”. Duplo chamado – à vida contemplativa e à escrita – que exigiu de Merton sofisticado exercício de controle interiorem seus já mencionados diários. Pela escrita de si, ele buscou harmonizar o cotidiano cisterciense e o trabalho literário, cuidando que o sucesso dele decorrente não comprometes seo cultivo das virtudes monacais (entre elas, a humildade). Nos diários, Merton procurou igualmente refletir sobre a construção de sua obra, que se diversifica tematicamente, tratando também de evitar problemas com a censura eclesial. Assim, além da teologia e espiritualidade católicas romanas, Merton, com o passar do tempo, abordou questões de grande apelo junto à sociedade contemporânea cada vez mais plural: direitos civis e segregação racial, não-violência, pacifismo e o risco de uma hecatombe nuclear, o despertar da consciência ecológica no planeta, diálogo ecumênico e relações entre culturas ocidentais e orientais.
Assuntos heterogêneos ligados pela preocupação de unirc ontemplação e ação. Associação que inspira título da coletânea póstuma Contemplation in a World of Action (1971). Para Merton, estava em jogo cruzar cristianismo e modernidade, construindo reflexão que fosse, simultaneamente, fiel à tradição cristã e de interesse ao homem contemporâneo, religioso ou não.
Neste espírito de abertura, favorecido pelo aggiornamento católico decorrente do Concílio Vaticano II (1962-65), Merton viajou para a Ásia, em 1968. Religiões e filosofias orientais exerceram atração sobre ele desde os tempos universitários. Nos anos 1950, Merton passou a estudar com afinco o budismo, em especial os mestres Zen. E o sonho de conseguir autorização abacial para viajar ao Oriente foi longamente acalentado. Graças a certa flexibilização da vida monacal ocorrida em meados dos anos 1960, a viagem foi, enfim, viabilizada Merton partiu com a missão de debater a renovação das práticas monásticas dos mosteiros beneditinos e cistercienses asiáticos. Antes, porém, cumpriria agenda particular intensa, tencionando estreitar laços inter-religiosos. Neste fito, visitou a India (em Dharamsala, teve três audiências com o Dalai Lama, à época já liderando o governo tibetano no exílio), Sri Lanka, Singapura e Tailândia.
Thomas Merton faleceu em Bangkok, acidentalmente eletrocutado, durante encontro ecumênico entre cristãos e budistas. Mesmo tendo a vida interrompida de forma trágica, Merton logrou confirmar, no Oriente, sua postura comprometida e dialogante frente à sociedade contemporânea. Posicionamento, frise-se, que ganhou forçana década anterior àde seu falecimento. Já em 1952, no livreto Basic Principles of Monastic Spirituality, Merton propusera que a internação no claustro não isentava o monge de responsabilidade em relação ao mundo extramuros. Responsabilidade a qual procurou ser fiel em sua trajetória de monge-escritor. Atividade de escrita apresentada, no trecho de The Sign of Jonas lembrado na abertura, como de caráter moral.