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por Emerson Sbardelotti


Pedro Casaldáliga Pla é o bispo emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia (1971 – 2005), no Mato Grosso, Brasil. Nasceu em Balsanery, na Catalunha, Espanha, em 16 de fevereiro de 1928. Foi ordenado sacerdote da Congregação dos Missionários Claretianos, em 31 de maio de 1952, aos 24 anos de idade; foi diretor de seminário e diretor de uma revista claretiana, a Íris, em Madri. No dia 30 de julho de 1968, chegou ao norte do Mato Grosso, encarregado de fundar uma missão. O maio francês e a Primavera de Praga faziam o mundo fervilhar; na América Latina e no Caribe, o processo de aggiornamento proposto por São João XXIII se fazia ecoar na Conferência de Medellín (Colômbia, 1968), que foi a realização na prática do Concílio Ecumênico Vaticano II (Roma, 1962-1965) por estas terras continentais. O Brasil que o padre Casaldáliga conheceu era um país pobre, envolvido por uma sangrenta ditadura militar. Um país onde sobrava a injustiça social, e por causa disso, germinava a profecia.

Em 23 de outubro de 1971, foi sagrado bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia. Como primeiro ato, publicou uma carta pastoral intitulada Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social, onde denunciou a situação iníqua da estrutura agrária brasileira, colocando a Prelazia e todas as suas forças em defesa dos lavradores e indígenas; posição mantida até os dias atuais. Tem como base teológica e espiritual o fato de que sua vida missionária é uma convicção de que Deus não está separado da vida de seu povo, de sua criação. Defensor e propagador da Teologia da Libertação e da Espiritualidade da Libertação, adotou como lema para sua atividade pastoral: Nada possuir, nada carregar, nada pedir, nada calar e, sobretudo, nada matar. É poeta, autor de várias obras sobre espiritualidade, antropologia, sociologia e ecologia.

No Brasil ajudou a fundar o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) em 1972 e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) em 1975. Escreveu mais de 25 obras em catalão, castelhano e português; em prosa e em verso, várias traduzidas para diversos idiomas. Junto com o padre José Maria Vigil é autor da Agenda Latino-Americana Mundial, além de participar de produções artísticas (cds, dvds, filmes e documentários), como por exemplo: A Missa da Terra Sem Males (texto de Pedro Casaldáliga e Pedro Tierra, música de Martín Coplas, 1980); A Missa dos Quilombos (texto de Pedro Casaldáliga e Pedro Tierra, música de Milton Nascimento, 1981); o filme Anel de Tucum (Verbo Filmes, 1994), onde faz uma participação especial e explica o sentido verdadeiro do anel de tucum. Recebeu prêmios e títulos no Brasil, na Espanha e em outros países. Teve a indicação de seu nome para o Prêmio Nobel da Paz no ano de 1992. Em 2011, a Verbo Filmes lançou um documentário que é um fiel retrato do bispo que é poesia e profecia, e que se chama: Pedro profeta da esperança – o legado de Dom Pedro Casaldáliga.

Em 2005 por conta da idade de 75 anos; renunciou, conforme pede o Código de Direito Canônico, ao governo da Prelazia de São Félix do Araguaia. 

Recebeu títulos de Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) por sua contribuição na luta pela defesa da vida e pelos direitos humanos. O mais recente título foi concedido pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), no dia 17 de setembro de 2014, no campus da PUC Ipiranga, sendo recebido pelo padre José Oscar Beozzo que o representou na outorga do doutorado na universidade.

Nos dias 13, 20 e 27 de dezembro de 2014, a TV Brasil em parceria com a televisão espanhola TVE e a catalã TVC apresentou um documentário em 3 capítulos de 52 minutos, intitulado Descalço sobre a terra vermelha; a película foi premiada na Ásia, no Festival de Seul, e pelo New York International TV & Film Awards. A minissérie é baseada na obra homônima de autoria do escritor Francesc Escribano.

Em 2018, Pedro Casaldáliga estará completando 90 anos de vida, 50 anos destes vividos na Prelazia de São Félix do Araguaia, onde foi administrador e primeiro bispo. Enfrentando ameaças de morte, convivendo com a morte de amigos, de posseiros, de camponeses, de peões, de indígenas, de lideranças que lutavam por dignidade, reforma agrária, direitos humanos. Através da profecia e da poesia de Pedro Casaldáliga se aprende que há possibilidade de ser uma Igreja Pobre, de ser uma Igreja Povo de Deus, pois a humanidade inteira é povo de Deus. Na profecia e na poesia de Pedro encontra-se os pobres do Evangelho. E a primeira missão de um bispo é ser profeta, e profeta é aquele que diz a verdade diante de todo o povo. Quando perguntado, o que fica hoje da Teologia da Libertação ele responde de imediato: “ficam os pobres e fica Deus”!

Para Pedro a Igreja de Jesus deverá ser sempre Igreja dos Pobres. Porque a causa de Jesus é o Reino, que é Boa Notícia para os pobres. Os pobres ocupam um lugar central na Igreja: esse lugar central é o resultado da soma da centralidade do amor, da justiça, da realidade humana e de Deus.

Resumidamente, Pedro Casaldáliga é um bispo de muitas lutas e de muitas causas, elas valiam, valem mais do que sua vida, que se tornaram mundialmente conhecidas pela altura dos seus gritos clamando justiça e de seus escritos a favor dos últimos, dos excluídos, dos marginalizados da sociedade. É um poeta, é um profeta, é um homem de fé, de esperança, de sonhos e utopia. 

Poema que expressa a relação entre Teologia e Literatura:

Domesticar a palavra

Domesticar a palavra
é a difícil missão
do silêncio,
do ouvido,
da espera,
da acolhida.
Só se aprende a falar,
aprendendo a calar com o Povo.
O Verbo se faz carne
no silêncio sofrido[1].

Exegese

Todos estamos de acordo
na leitura do Evangelho,
apenas discordamos 
na hora de vive-lo[2].

Canção da foice e do feixe

Com um calo como anel,
Monsenhor cortava arroz, 
Monsenhor “Foice e Martelo”?
Chamar-me-ão de “subversivo”,
eu responderei incisivo: o sou.
Pelo meu povo que luta, 
pelo meu povo que trilha apressado
caminhos de sofrimento.
Eu tenho fé de guerrilheiro
e amor de revolução.
E entre Evangelho e canção
peno, e digo o que sei.
Se escandalizo, primeiro
eu me abrasei de Paixão
na Cruz de meu Senhor!


[1] Casaldáliga, Dom Pedro. A Cuia de Gedeão – poemas e autos sacramentais sertanejos. Petrópolis: Vozes, 1982, p.36.

[2] Casaldáliga, Dom Pedro. Cantigas Menores. Goiânia: Editora da UCG, 2003, p. 47.

[3] Escribano, Francesco. Descalço sobre a terra vermelha. Campinas: Editora da Unicamp, 2000, p. 70.


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